quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Do mapa astral




Aguarda
o prometido
mapa astral
interpretado

Nalguma coordenada
evasiva
talvez descubra então
a “coincidência significativa”

ou numa confluência entre planetas
no sextil
entre Plutão e Netuno
em algum trígono com Júpiter

quem sabe dependa apenas
da vontade do sol
da lua

contida num sinal
enigmático
em sibilino número ainda
não decifrado

Talvez tenha cruzado seu caminho
desatenta
nem percebeu

A potenciação que aprendeu na escola
em todas as formas
pretende aplicar
sobre cada segundo do exíguo tempo
que ainda restar


Dezembro, 04 de 2013
Fotografia, Sidarta

* A sincronicidade é também referida por Jung de “coincidência significativa”



domingo, 24 de novembro de 2013

De antigo dicionário na estante da segunda sala



Saltam das páginas
flores
folhas secas
empalidecidas
envoltas em papel de seda
prensadas entre as folhas
do antigo dicionário

Fragmentos insignificantes
retidos num tempo
que já não tem mais forma
de lembranças confusas
misto de apego
desapego
incrustados nos livros
mimos

objetos que separa
Descarta

Então retoma a arrumação
da estante da segunda sala

24 de Novembro de 2013
Fotografia, Marlene

domingo, 3 de novembro de 2013

da boca da noite




Nada
cabe
no silêncio transpassado
da boca da noite

Invisíveis
sinais

não expressam
o instante

Teia da aranha
a limitar o vazio

Imitação do silêncio
e ainda
não o traduz


Novembro, 26 de 2011
Fotografia, Sidarta


segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Olhar de vento




Mal amanhece

E o vento
já balança
os galhos
da goiabeira

Caem num arremesso
misturadas flores folhas
frutos da laranjeira
forram o chão do quintal

Embaraça
em nova trama
franja da manta

esquecida

no varal


Dezembro, 13 de 2012
Fotografia, Sidarta

quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Sensorial






Imensas tuas mãos Ousadas
tateiam
cada centímetro

suavidade desmedida
desabotoam pausadamente
até o último botão da blusa

A boca tão aproximada
não se vislumbra
na penumbra
turva a visão Sutil
menta da tua língua
afoita
a vasculhar
céu da minha boca
invade
universo inteiro Calor
e frio
Arrepio

Entrecortado metal
da tua voz
de ensandecidos sons
grunhidos indecifráveis
nos meus ouvidos

Nem faço esforço
para entender


Julho, 17 de 2013
Fotografia, Marlene

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Nenhum vento a soprar nuvens ( Reeditado )






Procuro ínfimos símbolos,
qualquer prenúncio
no tempo,
também o universo conspira,

nenhum vento sopra
nuvens,
nem folha cai.
Busco

em epigramas escusos
ou em qualquer epígrafe
algum indício
nos poemas teus.

Olho
o fundo da xícara,
marca deixada

do café -
obscuro sinal
a dizer-me o que não sei

traduzir.


Fevereiro, 23 de 2012
Fotografia, Sidarta

sábado, 7 de setembro de 2013

Janela



Recorte do visível:
muro verde
imenso
pano de fundo
pronunciada presença
aranha alpinista
desce
invisível fio

Rabiscos de caracóis –
ilegíveis hieróglifos
grafados na umidade da manhã

Ar parado
num céu silencioso

Não fosse
esse resquício de azul
que escavei
e em outro céu
guardei

seria ainda cinza
esta manhã


Setembro, 07 de 2013

Fotografia, Sidarta

sábado, 24 de agosto de 2013

Do sábado






Dia que se repete
acaba
Fiquei na fila do silêncio
tantas pequenas coisas que não fiz
Ainda inverno aqui
faz muito frio
fome do dia que não aconteceu

fico a querer culpar a chuva
fina que nem ruído fez
Nem vi o céu
de tanto cinza
foi o entardecer

Fechei venezianas acendi luzes
cresceu a luz na sala
Reverso
cinzenta noite repetida ruma

e essa voz quase inaudível abismo
fala comigo
escuto som das pedras no quintal
nenhuma voz escapa
e me encontro
nessa não palavra


Fotografia, Sidarta 
Agosto, 24 de 2013

domingo, 26 de maio de 2013

Da previsão do tempo





Ínfima distância
no entanto
tanto tempo faz
O que falar

Passado
Presente 

Passado
todo esse silêncio
resta falar do instante
do tempo que faz agora

do lamento
no som do vento
do céu aquarelado dos finais de tarde
nuvens de chumbo
do que choveu
e ainda chove quase toda noite
noite adentro
tentar prever o tempo
da janela
aqui dentro
silenciado

Tanto tempo
tempo escasso
para querer saber tanto
a pressa
apressa
tempo
não haverá
para escolher palavras
falar de laços

Resta calar
aprofundar o olhar
medir a felicidade
no anelado abraço

Fevereiro, 10 de 2013
Fotografia, Sidarta

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Lembranças recorrentes no café da manhã






Carpinteiro de profissão
feito José,
fez-lhe uma escada
certa vez, o pai,
de madeira
e encaixe nos degraus
até demão de tinta deu
sobras que haviam numa lata
(“pro tempo não apodrecer”)
cor de cerâmica crua
- para as lides do quintal.

Mas ela usava
para subir nas nuvens.


Abril, 18 de 2013
Fotografia, Sidarta

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Da voz do mar




Diz-me o mar
na voz das ondas

diz-me
a molhar a areia

Prolongada fala

de eloquentes
profundezas


Fotografia, Sidarta
Janeiro, 05 de 2013

quinta-feira, 14 de março de 2013

Do teu silêncio





Apaguei
a tua voz
dos meus
ouvidos

insiste
a concha
em reproduzir

o som
do teu
silêncio


Março, 14 de 2013
Imagem, aquarela de Marlene Edir Severino

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Desses dias



        "Estamos a pocos pasos de una eternidad de silencio".
          (Alejandra Pizarnik - Fragmento de "Pequenos Poemas em Prosa")




Silenciosos cômodos
preenchidos
do vazio
da casa

Lá de fora
parece que se ouve
o instante do pousar
da folha
derrubada sobre a pedra

Por esses dias
somam-se
horas
manhãs
tardes

dias inteiros
a escutar silêncio

Janeiro, 4 de 2013
Fotografia, Marlene Edir Severino