sábado, 10 de dezembro de 2011




Tanta gente lá fora,
risos,
ruídos chegam aqui.

Meu País?
Solidão.

Feito aranha
que faz,
refaz a teia:
teço palavras,

reclusa
por opção.


((Imagem: fotografia de Marlene Edir, Parque Puquén, Chile))
Dezembro, 10 de 2011

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Além das Nuvens de Chumbo




A gaivota flutua no ar
plana
Flutuo
à deriva
Solto o peso dos pés
além das nuvens
de chumbo

Ruído de pássaros
cheiros do quintal
chegam até o limo
das pedras
deixado pela chuva

Tanto silêncio aqui
nem choro
solto pensamentos
deixo que sigam

Aguardo a noite
com a cara nas nuvens
espero as estrelas


(Imagem: aquarela de MarlenEdir)
Novembro, 15 de 2011

sábado, 22 de outubro de 2011

Esboço na Areia





Há coisas que demoram,
fincam âncoras,
leva tempo até partir:

a maré avança,
lava as rochas,
um leva e traz de galhos e conchas,

cava na areia um poço,
mas do desenho apagado

fica o esboço.



(Imagem: óleo de Marlene Edir Severino)
Outubro, 22 de 2011

domingo, 16 de outubro de 2011

Fusão em Vidro




Peixe de vidro azul bolha
sobre verde mar:
trabalho primeiro, mero experimento,
na queima
aparece o defeito,

vira saboneteira
no lavabo!

(Imagem: Experimentações em vidro, da Marlene))
Outubro, 7 de 2011

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Alinhavado Entardecer




Entardecer alinhavado no silêncio:
vaga a hora,
empalicede a cor do dia,
música triste canta o vento.

Esfria,

sopra o resto do dia
pela fresta da janela,
bate a porta
que deixei entreaberta,

parece que ecoa peito adentro
e traz um rosto, uma imagem
que nem fazia parte
desse final de tarde.


Outubro, 11 de 2011
(Imagem: óleo sobre tela de Marlene Edir Severino)

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Quase Tato, Sentir




Falar,
pode ser
dizer menos,

quase tato,
pode ser
sentir

o sutil
nas palavras
que vestem
vocábulos

com um tanto
de luz!


(Imagem: aquarela de Marlene Edir Severino)
Setembro, 26 de 2011

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Certeza




Apenas uma porta que bateu com o vento
porque a esqueci aberta,
talvez a espera, na viagem que fiz
olhando a rua através da janela:
velho hábito antes de dormir,
conferir se o portão ficou mesmo fechado,

deixei o texto inacabado,
mas pude assim
constatar mais uma vez a solidão da rua deserta,
quando o vento livremente dela se apossa
a varrer as folhas, algum papel deixado,
todo cisco,
até mesmo alguma marca de anônimo passo

(ficou algum vestígio dos meus passos?)

Mas o vento ainda é frio
e já quase primavera,
antes de fechar a porta, a janela,
olho o céu pintado de luzes,
espalhadas estrelas parece que me contam de ti
e dos faróis de um solitário carro na rodovia,
esquecida, fico a imaginar a tua madrugada.

A lua é cheia, nem percebera
e o vento secou todas as poças d’água da calçada.

Deixo o eco de tudo lá fora
Quem sabe vá bater no opaco vidro da tua redoma,
cada vez mais tênue fica tua imagem
e a minha
certamente de ti já se dissipou.

Fecho a janela
e retorno a minha mesa.
Anônima,
retomo meu poema, minha falta de rotina,
toco a vida, falo pra mim mesma:
- não poderia mesmo ser de outro jeito!

Tento convencer-me disso
antes de dormir.


(Imagem:Aquarela de Marlene Edir Severino)
Setembro, 13 de 2011

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Pomar Adormecido






Num lapso de tempo
encurtadas distâncias,
riscadas as fronteiras
do mapa,

trocados poemas:
mercadores de coloridas asas,
em alçados voos.

Indiferenças, vagos horizontes,
nem sinais de primavera,
do outono passado, alguma cicatriz

no tronco podado, leve traço
e o pomar está adormecido,
asas de vidro, vazios os ninhos,

nenhum pássaro.

(Imagem:aquarela de Marlene Edir Severino)
Setembro, 2 de 2011

sábado, 20 de agosto de 2011

Zíper




Ausência
é tua marca:
indiferente, vago.

Incomoda às vezes
essa distância
feito zíper na pele:
machuca.

Mais próxima sinto-me
da lua.


(Imagem: aquarela de Marlene Edir Severino)
Agosto, 16 de 2011

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Lápis-lazúli




Pendente no pescoço
o coração
pingente de lápis-lazúli
que me deu

A tarde se prende num fio invisível

Desprendo-me do sorriso
livro-me dos poemas
sem pena
a tarde se foi

Conservo o coração
em azul escuro
de lápis-lazúli

a noite se fez

(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Julho, 28 de 2011

domingo, 17 de julho de 2011

Instante




E em todo esse silêncio
o mais difícil mesmo é decifrar
o que nele está contido:
coisas caladas, perdidas sem nome

em invisíveis transparências.
E fico a olhar nuvens,
a mastigar palavras

e nos passos pela casa,
sorvo este instante

de indefiníveis invisibilidades.


(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Julho, 17 de 2011

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Papel Amassado




Rotineiro dia,
tanto nada:
de tantos pássaros no final da tarde,
um vento que bate a veneziana,
a folha que plana
antes de juntar-se a outras no chão

e as árvores cada vez com menos folhas.
Um nome pronunciado, quase sussurro
a não quebrar o silêncio. Sopro
da mesma ausência de outras margens.

Palavras escritas além das margens do papel,
equivocadas, ilusórias.
Minha boca seca na quase ausência de som.

Papel amassado
guarda alguma poesia.

(Imagem: aquarela de Marlene Edir Severino)
Julho, 08 de 2011

terça-feira, 21 de junho de 2011

Fel





É madrugada,
a rua dorme,
tanta quietude não me deixa dormir.

Arde vida
debaixo de cada palavra
que escrevo,
fica pulsando
em mim,

e nesse instante
quero que fique presa,
assim me desobrigo
do que não vou dizer
melhor que este silêncio.

E sorvo a inutilidade,
a não-palavra:
seca, vazia,
arestas,
quinas,
fel

da língua.

(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Março, 29 de 2011

terça-feira, 7 de junho de 2011

Inseto Na Poça D'água




O dia a empalidecer da janela,
frio anunciado,
escorrida hora, lenta chuva
e um inseto nada

na transparência da poça d’água.
Consumido dia.
Sussurros da chuva na janela
a abrir silêncio. Voo da alma:

fio suspenso, teia,
aranha equilibrista,
úmidas pegadas de inseto na calçada.

Adequar o pulsar à pálida face
da noite que inicia. Lua escondida
entre nuvens no lívido céu.


(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Maio, 19 de 2011

quarta-feira, 25 de maio de 2011

De Abril





Fora do chão, busco estrelas,
chego nesta estrada ainda a procura:
tenho cura?

Cancelei viagens, interrompi caminhos
e tive que buscar atalhos sequer imaginados
a me refazer em todos os cansaços,
estive de mim ausente quase uma vida:

existe saída?
Pra emergir minha vontade,
minha pressa,
apressada feito porta de emergência...

E tenho todas as idades no mesmo dia,
planos completos em menos de um segundo,
vou ao fundo e crio personagens para cada emoção.

Vivo intensamente aos solavancos,
despeço-me humildemente de cada instante
ínfimo, sutil,
porque o próximo será novo, único
e diferente também estará o meu olhar

se ainda aqui estiver, então

nado de costas, para poder olhar novamente
o céu de abril.


(Imagem: aquarela de Marlene Edir Severino)
Maio, 25 de 2011

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Poções




Borbulhar das poções. Salamandras,
atiçar das cinzas.
Opaco é o vidro da tua redoma,
engole-me o abismo do teu olhar.

Deixa teu cheiro no caminho,
do timbre da tua voz uma semente
ao vento, eco dos teus passos
lentos, resquício de pegadas tuas

na caminhada da manhã...
Ou um fio de cabelo,
linha da tua camisa,

digital em alguma pedra,
qualquer indício
pra completar esse feitiço!

(Imagem:Aquarela de Marlene Edir Severino)
Maio, 19 de 2011

sábado, 14 de maio de 2011

Olhar de Vento




"... que em teus cabelos nasça a chuva"
(Fernando José Karl)



A lua crescente, quase cheia
emoldurada na minha janela
a me fazer lembrar, o teu olhar de vento
soprou cheiro de flor na minha pele,

e nuvem de linho
fez nascer a chuva em meus cabelos,
o frouxo riso, a língua solta,
vinho na taça,

meu beijo adolescente na tua boca
e teu abraço abrupto a me prender
junto a teu corpo frêmito: tua noite minha manhã.

E nos encontraremos,
quem sabe, súbito,
na mudança de rotina de um dia qualquer.


Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Maio, 13 de 2011

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Desassossego





Num trôpego desassossego
feito pedra solta
quase arrancada da areia,

a esmo

prego meu apego,
diluo entranhas na casa:
mistura de desapegos, cegos tropeços,
apegos parcos,
vãos apreços

diluem-se no vão das frestas,
se vão com o vento,

mas incansável rego:

sôfrego córrego
de tanto desassossego.


(Imagem:Aquarela de Marlene Edir Severino)
Maio, 08 de 2011

domingo, 1 de maio de 2011

Água Viva





Domingo.

O dia se desprende,
vagarosamente escapa
pelas beiradas da espera,

água viva
lenta, solta no mar
da Praia Brava.

Bocejo
do teu insonoro e desolado
falar sem palavras:
sem corpo, sem cheiro
sem pele,

nem espero.
Acho que não quero mais.


(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Maio, 01 de 2011

sábado, 23 de abril de 2011

Mero Instante




Transporto-me para o papel
no silêncio dos cômodos da casa,
atulhada mesa de anotações,
rascunhos, soltas palavras,
interna radiografia de outras
presas na garganta
seca.

Inadequadas
a tentar definir arrebatado,
sub-reptício momento,
inquieta travessia transgressiva
desse instável mapear

instantâneo
de intrínseca geografia,
mero instante.
Anestesiado, integra-se
aos compartimentos vazios,

insonoro,
apropria-se de tudo
num indefinível cerimonial,
instigante traduzir:

agora etéreo.

(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Abril, 23 de 2011

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Azul Traço



Anônima transeunte
nem marcas deixam
meus passos
pela rua
e no caminho ouço
eco de passadas
ocas
nuas no chão

Respiro silêncio
quebrado
pela minha pulsação

Nas ruas o muro alto
espreita
encontra-me sua sombra
sombrio vagar

Transporto-me neste poema,
de azul traço engarrafado
atirado ao mar.

(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Abril, 14 de 2011

sábado, 9 de abril de 2011

Além do Quintal: A capa




["e agora a confissão: sabia que a "minha primeira palavra impressa", aconteceria no Brasil..."] Leonardo B.


“Se ao sairmos aos caminhos, pela manhã ou pelas tantas outras partes do dia, na companhia de poemas e aquarelas arrumadas num livro, saídos aos caminhos como se partíssemos para um inventário do dia, esquecidos de nós, levando aconchegadas nas mãos as composições de Marlene Edir Severino, então, o caminho, como todos os passos que o podem compor na composição do poema e aquarela, serão, decerto, espontâneos momentos que nos recordam a provisoriedade do aquém e além, dos vultos que fomos construindo e que na poeira que se insiste no caminho e aí se revela, rumo á finita incerteza da mudança, se revelam neste livro que agora temos entre as mãos.

E se agora enquanto instante, e se depois como breve traço do tempo, tomássemos nas mãos esse cálice de terra, pedaço de livro de tantas horas, que se chama vida ou sereno adiamento da sombra, pacifica e revolta placidez de silêncio, que se murmura nos segredos de quem tem muito por contar, da beleza que só os olhos sem cansaço são capazes de reter, na poesia que entrelaça na imagem, na aquarela que se derrama na palavra, e juntas agora, e se depois, ao caminho, com um livro debaixo do braço, levássemos o tempo, reinventando-o como ao “rosto (que) começa a desenhar-se sobre a superfície do tempo”, como sublinhou Yourcenar acerca da memória, da construção tranquila do tempo?

Então, todo o caminho, todo este livro que trazemos connosco, constrói-se na margem também, na sombra que já não se sabe hesitar e acorda na palavra entalhada na aquarela do dia, em todas as suas possibilidades, em todos os seus sóis ou chuvas breves e bem delineadas, nos carreiros aconchegados pela pedra esquecida, no rebordo da praia resguardada pela aba do mar, pela ruas e avenidas desgastadas pelos passos perdidos e achados, pelos lugares onde todo o caminho é livro, transbordo de vida, paragem maior muito além de onde o caminho começa, além do mínimo olhar, além do vasto quintal”

Leonardo B.
Bizarril, Janeiro 2010

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Lançamento do Livro Além do Quintal


Breve Nota: Aos que não conhecem a autora e seu trabalho, importante informar que Além do Quintal, poemas e aquarelas, não foi contemplado com nenhuma lei de incentivo, ou qualquer outro, empresarial e os apoios mencionados no convite referem-se a disponibilização do espaço da Fundação Cultural, ao convite e coquetel a ser oferecido durante o evento.


domingo, 3 de abril de 2011

Que Partiu



Madrugada que se arrasta,
o som da chuva na vidraça
e a escorrer lá fora
telhado abaixo

ensurdece ruídos
de cômodos vazios.
Dos balbucios da calada madrugada,
fica o descompasso

do desolado silêncio
que partiu.

(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)
Abril, 2011

terça-feira, 29 de março de 2011


Teceduras


O vento destroçou

a teia da aranha

Indiferente


tece, recria

com calma

tudo novamente


Olho a aranha

teço palavras

sonâmbula


fixo no papel


De sonho vazia


(Imagem: Aquarela de Marlene Edir Severino)

Março, 29 de 2011

sábado, 26 de março de 2011

Desvanecido Instante

Cada gota de tinta
diluída em água
absorvida no papel
tatuada
funde-se ao silêncio
quebrado
em cada palavra teclada.

Limite da palavra
ilimitado pensamento
tinta desordenada
rompe limites do papel

invisível fala
silenciada em cada tom
da aguada

instante quase sem som

traduz
gota a gota de tinta
palavra por palavra

desvanece
o instante

sem traduzir este silêncio...

(Imagem: aquarela de Marlene Edir Severino)
Março, 26 de 2011- 22h05

segunda-feira, 21 de março de 2011

Avesso

Esboço traço

traçado,
à tona
meu avesso.
(Imagem: aquarela de Marlene Edir Severino)
Março, 21 de 2011

quarta-feira, 9 de março de 2011

Cacto


A voz da tua boca
a cuspir palavras
vãs,
ambíguas,
ásperas, curtas,
sulfúricas:

espinho de cacto
da tua língua

de trapo.
Arremedo de presença.
Míngua.

Lua minguante no céu.


(Aquarela de marlene edir severino)
Março, 9 de 2011

domingo, 6 de março de 2011

Oquidões



Desordenado vento
revolto e obscuro a quebrar silêncios,
instabilizar oquidões,
salpico de hesitantes abismos.

Levou em turbilhão
poeira de estrelas,
turmalina de olhos marejados,
olho d’água,
redemoinhos, remansos,
fragmentos,
volúpia de ambíguo deleite.

De sonhos de montanhas
a pés fincados no chão:
rudeza do óbvio,
atalho de ilusório acorde
ampliado de tua imaginada voz
tingida de arco-íris.

Na tarde esvaecida, sei tão pouco,
de cigarras secas, de dança de folhas
movimento de avencas,
código das pedras.

E fico quase nada.

(imagem: aquarela de marlene edir severino)
Março, 6 de 2011